Todos, Nenhum: Simplesmente Humano – Jeff Garvin

Todos, Nenhum: Simplesmente Humano é desses livros que, mesmo quando acabados, não terminam. Ele fica com a gente, ressoando, tornando eco os sentimentos que provoca e as reflexões que suscita. Uma história de importância ímpar que reafirma o papel da literatura para a fomentação das discussões cada vez mais urgentes da sociedade em que vivemos, o livro relata através da experiência de um adolescente de gênero fluído, as experiências de não se enquadrar nas predeterminados sociais que são impostas.

Riley, não se sabe ser menino ou menina e este é exatamente o ponto de partida para que a narrativa se debruce sobre a questão. Ora se identifica mais com o gênero feminino, ora com o masculino, ora com os dois ou nenhum dos dois. Isso pode causar certa confusão até para os mais inteirados com o tema e é extremamente difícil escrever essa resenha referindo-se ao personagem sem atribuição de pronomes.

Confesso que certamente vacilarei - e desde já peço desculpas a Riley (a pessoa Riley). Sendo Riley esse alguém que move a narrativa, somos nós convidados a fazer uma autoanálise sobre a maneira como questões assim ainda são vistas como tabu - e acredito sinceramente no poder do livro de potencializar essas vozes caladas.

Mas o enredo também extrapola esses limites que cercam Riley pela  sua própria razão de ser como é. De fato, a centralidade do enredo está focada na questão do gênero, só que como todo bom livro há muitas outras particularidades da história que torna a obra memorável.

Jeff Garvin é tátil e ágil ao inserir elementos juvenis que incluem os sentimentos de solidão pelos quais a maioria dos jovens passa, a sensação de ser diferente em um mundo de iguais, o bullying na escola, a dificuldade de encontrar amigos e a transgressão de regras.

Através de Riley - que mantém um blog na internet (anônimo!) - o autor encontra maneiras sutis de mostrar ao leitor as sutilezas da adolescência, a crueldade da fase e também suas delícias.
Sem contar que os personagens que cercam Riley são importantíssimos para a construção e evolução da narrativa e dos descobrimentos do enredo.

Com cenas bonitas e dolorosas, necessárias e potentes, Garvin dá vazão a uma literatura que cumpre bem o dever de questionar, inquietar, e, por que não, incomodar.

E neste ponto da resenha, em que estou acabando de expor a maneira como minha afetação se torna evidente a partir de histórias tão críveis e aterradoras, você deve estar se fazendo a mesma pergunta direcionada e errônea: afinal de contas, essa pessoa, Riley, é um garoto ou uma garota?

Agora pare. Releia essa pergunta. Quantas vezes forem necessárias até que ela se transforme em outras: que importância isso tem, afinal de contas?

Leiam o livro. Façam esse tipo de obra circular. As mudanças começam assim.
Boa leitura!

“A primeira coisa que você vai querer saber sobre mim é: sou menino ou menina?”
Riley Cavanaugh é um ser humano com muitas características: perspicaz, valente, rebelde e… gênero fluido. Em alguns dias, se identifica mais como um menino, em outros, mais como uma menina. Em outros, ainda, como um pouco dos dois. Mas o fato é que quase ninguém sabe disso.
Depois de sofrer bullying e viver experiências frustrantes em uma escola católica, Riley tem a oportunidade de recomeçar em um novo colégio. Assim, para evitar olhares curiosos na nova escola, Riley tenta se vestir da forma mais andrógina possível. Porém, logo de cara recebe o rótulo de aquilo.
Quando está prestes a explodir de angústia, decide criar um blog. Dessa forma, Riley dá vazão a tudo que tem reprimido sob o pseudônimo Alix.
Numa narrativa em que o isolamento é palpável a cada cena, Jeff Garvin traça um poderoso retrato da juventude contemporânea. Somos convidados a viver a trajetória de Riley e entender o quê, afinal, significa ser humano.

3 comentários

  1. Eu acho fantástico quando esses temas tão importantes são abordados pela literatura, acho que além de dar informação e incentivar à leitura esses livros tornam assuntos que, muitas vezes são de difícil entendimento, em algo mais fácil de compreender. Acho que mostrar a história de um personagem que passa por essa situação e também os outros impactos que a adolescência traz é super importante, isso ajuda o leitor a entender tudo mais claramente e se colocar no lugar do outro.
    Com certeza esse leitura deveria ser obrigatória!

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  2. Ronaldo!
    Pois é... até que ponto é necessário se determinar um gênero para alguém?
    Infelizmente nossa sociedade exige isso quando vamos preencher um formulário, um curriculo, a certidão de nascimento e por aí vai. Mas será que na convivência é preciso determinar um gênero?
    O que gostei foi o fato do autor trazer as dúvidas, questionamentos, problemas, gostos, etc dessa pessoa protagonista e nos fazer pensar sobre o fato.
    Muito bom o livro.
    Bom final de semana!
    “O prazer dos grandes homens consiste em poder tornar os outros felizes..” (Blaise Pascal)
    cheirinhos
    Rudy
    TOP COMENTARISTA JULHO - 5 GANHADORES - BLOG ALEGRIA DE VIVER E AMAR O QUE É BOM!

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  3. Acho maravilhoso quando um autor ou autora conseguem colocar pontos tão intensos e densos, de uma forma mais leve e com isso, fazer o leitor mergulhar de fato nos dramas dos personagens.
    Tenho uma amiga que sempre diz: enquanto a raça humana usar gêneros para definir o que somos, a humanidade em nós estará perdida.
    E ela está correta. E tenho uma prima que diz que perdeu o próprio nome, sua identidade, ao virar "A gorda".
    Até quando a raça humana vai separar os seus por categorias? Somos pessoas, fato. Isso não basta?
    Não..sei que não!
    Por isso, é preciso que mais autores tragam temas assim, como sexualidade, sendo apresentadas assim, na forma que faça com que o leitor se questione e embarquem nas dores e delícias de ser Humano!
    Com certeza, espero ler!
    Beijo

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