José Luís Peixoto é português, mas escreve numa língua que inventa no acaso. Subverte tudo e vai criando seu próprio idioma lúdico, cheio de variantes e costurado com uma pontuação peculiar, sentimento escorrendo das mãos e se transformando em história. Assim é “Morreste-me”, seu livro primeiro, que não apenas revelou seu nome na literatura, mas o consagrou.
O livro é uma novela que recria um cenário de luto e profundo pesar: a perda do pai e o desfalecimento do filho que o via como ele próprio. Com características de gênero que dizem acompanhar mais um fato em detrimento de um aprofundamento psicológico – até pelo número reduzido de páginas – a novela “Morreste-me” é conduzida por Peixoto numa mão contrária: mergulha no sentimento como se quisesse eternizá-lo.
E acho que é por isso o eterno. Na obra, o autor faz uma investigação tática da dor, da aflição, do desespero e da serenidade. A narrativa é, sobretudo, construída com mãos hábeis, guiada em direções que pegam o leitor desprevenido. Não é linear, mas segue um rumo certeiro e atinge quem está lendo como uma flecha precisamente mirada. E emociona. E faz valer o sentir, o se permitir, o chorar.
Em pouco mais de cinquenta páginas, Peixoto expõe um recorte de sua vida que o faz humano: a morte de alguém que ele amava do seu âmago, do seu eu mais fundo. Seu pai. Pai. Desde a volta à sua terra para enterrá-lo, até sua visita à casa que foi palco de sua infância feliz e permissível, ele se deixa ir rumo ao que lhe mais dói. Dói no leitor também.
Embebido em sentimentalismo sem apelar à emoção, “Morreste-me” acaba sendo do tamanho ideal para ser inesquecível. Página a página ele vai fixando em nós o desejando de ir desbravando toda a obra do autor que vem e nasce depois (eu recomendo que vocês conheçam principalmente a produção poética dele). Sua narrativa é esteticamente apreciável, prazerosa e bonita. Suas palavras são como quadros que olhamos por muito tempo buscando uma ressignificação.
Leiam Peixoto. Leiam “Morreste-me”. Se deixem ser também essa coisa que a gente não sabe sentir, mas sente.
Boa leitura!
Morreste-me, texto que deu a conhecer o jovem escritor José Luís Peixoto, é uma obra intensa, avassaladora e comovente: é o relato da morte do pai, o relato do luto, e ao mesmo tempo uma homenagem, uma memória redentora.
Um livro de culto há muito tempo indisponível no mercado português.
Lendo a resenha me vieram as palavras de Saramago. Sei lá, o desenhar das letras, o carregar dos sentimentos. Parece que José Luis Peixoto segue a mesma forma lúdica de traçar suas letras e isso é fascinante!
ResponderExcluirUma pena que livros assim nos passem despercebidos na maioria das vezes.
Como eu não o conhecia, vou colocar na lista de desejados.
Beijo