Auto da Compadecida. As cortinas se abrem e lá estão, o palco iluminado, o palhaço conduzindo a narrativa: João Grilo e Chicó. Auto da Compadecida. Teatro popular. Reinvenção. Crítica. Um texto excelentíssimo, diálogos verdadeiramente autênticos, situações cômicas, do trágico ao absurdo do absurdo. Auto da Compadecida. Quem não viu, viu, e ninguém sabe: só sabe que foi assim.
Você, leitor, já deve ter se deparado com a mais famosa adaptação do teatro de Suassuna, o trabalho audiovisual dirigido por ninguém menos que Guel Arraes. Pois ali posta – ou melhor, transposta – está a obra compadecida do Ariano: tirando um pouco, acrescentando outro bocado, mas preservando intacto o espírito das palavras, das situações, da dramaticidade e comicidade que sustentam a narrativa secular.
Auto da Compadecida. O livro é aquilo que quem já viu o filme sabe. Mas é mais. É, até certo modo, de se contentar. Então por quê, podem perguntar, você está se dando ao trabalho de resenha a obra (se já é o que é)? Vou dizer que porque vale ter nas mãos e sentir nas pálpebras o texto vivo do autor. Vale pela maneira como o Ariano enxergou a disposição das cenas, dos cenários, da própria identidade subversiva de cada personagem.
Talvez a diferença mais notável com o filme seja o fato da história, em seu original, ser guiada por um palhaço – um palhaço literal, desses que a gente tem num imaginário sob a lona de um circo e com a cara pintada. Ela diz: que seja feito isto ou aquilo – como um criador moldando as pequenas criaturas. Que são Grilo e Chicó. O padre. O padeiro e sua mulher. Os homens do cangaço. Bispo e sacristão. Deus. O diabo. E claro, a Compadecida. Tudo sobre um palco. Teatro em carne e osso. Espinha dorsal textual que faz o leitor, até mesmo o que já conhece o final da trama, tremer um pouco. E se emocionar. E rir até umas horas.
Foi meu primeiro contato com a obra do Ariano e ninguém poderia começar melhor do que por aqui. No fundo, no fundo, Auto da Compadecida é uma história confortável para todos – confortável no sentido de intimidade (estou muito contando que todos vocês, que chegaram até aqui, conheçam minimamente e de maneira geral a história, por isso poupo um resumo e parto para a experiência). E aí fica fácil de se deixar embalar.
Leiam. Sintam como é bom o paladar amaciado pelas palavras do Ariano. Quero provar mais. De outras coisas. De outras danações autorias que se reinventam na cultura do Nordeste, na crítica afiada das situações paradoxais e na cara autêntica que cada personagem ganha nas mãos de quem sabe o que está fazendo. Salve Ariano!
O "Auto da Compadecida" consegue o equilíbrio perfeito entre a tradição popular e a elaboração literária ao recriar para o teatro episódios registrados na tradição popular do cordel. É uma peça teatral em forma de Auto em 3 atos, escrita em 1955 pelo autor paraibano Ariano Suassuna. Sendo um drama do Nordeste brasileiro, mescla elementos como a tradição da literatura de cordel, a comédia, traços do barroco católico brasileiro e, ainda, cultura popular e tradições religiosas. Apresenta na escrita traços de linguagem oral [demonstrando, na fala do personagem, sua classe social] e apresenta também regionalismos relativos ao Nordeste. Esta peça projetou Suassuna em todo o país e foi considerada, em 1962, por Sábato Magaldi "o texto mais popular do moderno teatro brasileiro".
Nossa literatura nacional é tão rica, mas tão rica que sempre enche o coração de orgulho quando a gente chega num blog e vê algo assim, estampado para todos se deliciarem.
ResponderExcluirSuassuna é soberbo em suas letras, em matéria de retratar coisas que só a região nordeste tem. Não só o povo sofrido,mas o povo que acredita, que tem fé.
Acabei lendo algumas obra dele na biblioteca da minha cidade,mas infelizmente, com Auto, só tenho a adaptação do cinema mesmo(que aliás, é um espetáculo que a gente não se cansa de ver e rever)
Vou procurar por este livro, pois é como você citou, não é somente ler, é ter!
Beijo
Ronaldo!
ResponderExcluirJá tive oportunidade de ler a obra e é fascinante como o glorioso Ariano Suassuna, dispões o enredo de uma forma bem teatral e totalmente compreensível.
Sou orgulhosa de ter tido oportunidade de conhecê-lo pessoalmente e conseguir autografar meu livro com ele. Sempre o encontrava, pois uma grande amiga, era vizinha dele em REcife e ele erea de uma simplicidade e inteligência que me espantava.
Pena que os bons se vão tão rápido, mesmo tanto a produzir ainda apesar de sua idade.
Desejo um mês mais que abençoado, carregadinho de luz e paz e um final de semana esplendoroso!
“Acredite, existem pessoas que não procuram beleza, mas sim coração.” (Cazuza)
cheirinhos
Rudy
TOP COMENTARISTA MARÇO: 3 livros + vários kits, 5 ganhadores, participem!
BLOG ALEGRIA DE VIVER E AMAR O QUE É BOM!
A literatura nacional em toda a sua riqueza e singularidade está presente nesse obra magnífica de Suassuna! Não há como negar que é um romance que todos deveriam ler,principalmente, os amantes de carterinha da adaptação cinematográfica.
ResponderExcluirParabéns pela resenha!!
Oi Ronaldo,
ResponderExcluirVocê acredita que já vi várias vezes o filme mas nunca cheguei a ler o livro?! Que ótimo o livro também conter diversas cenas autênticas, divertidas e até absurdas, pois é assim que eu vejo e sinto no filme também.
Com certeza mesmo já tendo visto uma adaptação boa nada se compara a ler uma obra, é a visão do próprio criador da obra, pois acaba que a adaptação tem um pouco da visão do diretor e como ele sentiu em relação ao livro, mas quando nós lemos conseguimos tirar as nossas próprias conclusões sobre o que o autor pensou e o que pensamos também a respeito dos temas abordados.
Nossa fiquei surpresa por saber que é um palhaço que narra a história, o que me intriga mais ainda para checar se é melhor nesse sentido.
Concordo com você que conseguimos embalar na história ao criarmos intimidade e se é o que o livro nos apresenta eu tenho certeza que se torna uma leitura gostosa e prazerosa.
Parabéns pela resenha e que ótima leitura, pretendo com certeza conhecer a escrita de Ariano por o Auto da Compadecida.