Uma coluna para chamar de minha, com Vivi Lima

E o diálogo, cadê?

Para mim, o grande ganho da Web 2.0 é fazer-nos perceber que a tecnologia por si só não faz com que dialoguemos melhor. Qualquer diálogo que se preze requer disposição e boa vontade de quem dialoga. Meios, temos muitos. Mas a mensagem não pode, nem deve ser proferida de qualquer modo.

Hoje, tenho por certo que rede social não é apenas meio, não é apenas tecnologia. Não é clique. É atitude. Mas, será que estamos bem de atitude?  E trazendo para o assunto principal desse post: será que o diálogo está a perder  espaço nas relações humanas?

Entendam, não quero ter o monopólio do que é certo e errado e das respostas acabadas. Talvez sejam perguntas que dependam da visão de mundo do respondente. Cá de mim, respondo a partir de um lugar que prioriza, no ato comunicativo, o respeito, a discrição, a sabedoria em saber o que, como, para quem e quando dizer e a pesquisa de fontes autênticas. Isso só pra começar.

Com base nisso, vou responder brevemente as duas perguntas supracitadas a partir do que tenho visto:

Há muita opinião e pouca conversação.  Há muito falar e pouco ouvir. Muitos ecos e pouca reflexão. Muito “curtir” e “compartilhar” e pouca troca de ideias. Mais controle e vigilância e menos liberdade. Há mais interesse em produzir conteúdo do que exprimir emoções e pontos de vistas.

Estamos na era do divulgar-se a si mesmo.  Então, nos postamos e nos portamos para sermos o assunto do dia. Mas, percebam, não do dia todo. Afinal, a ordem diária é a de sermos consumidos fugazmente e deixados para trás no breve espaço dos segundos em que a barra de rolagem saltita em conformidade com os inúmeros desejos e vontades de quem nos lê.

Analisando discursos e atos manifestos nos blogs e canais sociais em voga, vejo poucos exemplos em que o emissor não esteja interessado em ser ele próprio o assunto para os comentários. E por falar em comentários, ah, que saudade de um tempo em que os blogs não eram tratados como mercadorias; em que contrariamente aos interesses estatísticos, os comentários eram estimados por seu valor intrínseco de ser dialógico e permitir interpretações e pensamentos até mesmo diversos.

Cada vez mais, as ferramentas estruturam-se de forma a compactar o conteúdo em espaços tão diminutos que fica difícil ter uma ideia esclarecida do todo. Não dá outra. Quanto mais reduzido é o espaço para ler e comentar, o acompanhamento do desenvolvimento da discussão será prejudicado. Previsão do resultado da negligência com as palavras? Muito teclado e opinião. Pouca visão e adição. Porém, pouco nos preocupamos com isso.

Em situações do tipo, lastimo não sermos dados a conhecer os princípios mais sutis e sofisticados das coisas. Não estou a falar pela via do esnobismo não. Estou falando de sofisticação no sentido de compreender a coisas com profundidade. Porque nos contentamos apenas com a superfície? Em olhar por cima do muro?  Ouvimos por alto, lemos por alto, entendemos por alto e fazemos por alto. E assim vamos vivendo. Fechados em nosso casulo, olhando para o nosso próprio umbigo e celebrando a estupidez, como cantou Renato Russo. Ora, tal postura é tão pedante quanto o esnobismo intelectual. De uma parte ou de outra, ignorância totalitária me assusta. Assusta-me que, em nome da imposição de uma cultura imediatista e espontânea, deixemos o senso crítico no baú de nossas mentes entulhadas de vazio.

Digam-me se eu estiver dizendo besteiras ou exagerando.  Digam-me se veem ou não o mesmo que eu vejo: o indivíduo como sinônimo de pessoas.  A maioria falando a mesma coisa sem a elegância e a responsabilidade ética de conceder espaço para os pensamentos divergentes. O grande alcance da sabedoria das multidões que, pouco a fim de conversa e prescindido da opinião individual, determina um conjunto de sentimentos cuja sequência de movimentos se desdobra numa onda maria-vai-com-as-outras.

Repito, sei que minha fala soa pessimista. No entanto, enquanto houver um naquinho que seja de simulacro de liberdade, permito-me tomar partido da resistência. Não estou a criticar as Novas Tecnologias. Estou a criticar a negligência quanto ao uso da maior e melhor tecnologia de que dispomos: a mente.

Não sei o que futuro reserva às relações humanas. Ainda assim, anseio por um mundo em que os corações estejam aparelhados de ferramentas essenciais como o amor, a ética, a liberdade, a verdade e a sabedoria.  Ou, nas palavras do poeta:

"Escolhe teu diálogo
e
Tua melhor palavra
ou
Teu melhor silêncio
Mesmo no silêncio e com o silêncio
Dialogamos"

(O constante diálogo, de Carlos Drummond de Andrade in Discurso da Primavera)


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13 comentários

  1. Vivi, é o que estava falando ontem no FB: dá até medo opinar nessa época de privilégios do 'eu'. A pessoa desata a melindrar e de troca de discussão, vira briga. Mas ainda acho que a tecnologia é só o meio de expressão. O bom e o ruim do ser humano só estavam lá, à espera de encontrar como sair.

    Belo texto, como sempre.

    Beijos!

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  2. Concordo, Lilian. Acho maravilhoso termos a facilidade da modernidade tecnológica para falar de coisas tão antigas como as idiossincrasias humanas. De fato, as pessoas trazem para o entorno de suas relações tudo aquilo que, de bom e ruim, têm dentro de si. Daí a importância de estimular a boa consciência para que o mundo, apesar de ser o que é, reproduza atitudes de boa fama, né? Sei que soa como um discurso sonhador, mas proponho que continuemos a plantar essa sementinha ideológica aqui e acolá. :)

    Amo contar com as suas observações, dear Cupcake!

    Beijocas

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  3. A Leninha já tinha me avisado que eu precisava vir aqui ler esse texto e só não vim antes por pura falta de tempo mesmo.

    Primeiramente, Vivi, quero parabenizá-la por tão eloquente discurso! Disse muito do que eu penso.
    Como a Lil disse, acho que a tecnologia é só uma ferramenta e é só exclusivamente culpa do ser humano não utilizá-la de uma forma construtiva e engrandecedora.
    Acho o diálogo fundamental, seja pessoalmente ou por meios de comunicação, como telefone e internet. Mas o que vemos hoje são pessoas que não querem o diálogo. Porque não aceitam uma opinião diferente da que têm, porque não sabem discutir ou argumentar, porque perderam a capacidade de enxergar o outro por detrás dá enorme barreira criada por seus egos gigantescos. Estão atrás do maior número de seguidores, de amigos, de curtas e compartimentos. Querem estatística e pouco se preocupam com o relacionamento. Mas perdem!
    No meio de tanto ódio (esse é outro ponto que me incomoda demais no comportamento das pessoas na internet: o ódio. Não dá para simplesmente não gostar muito de alguma coisa, é preciso odiar, rechaçar, sair por aí falando mal e metendo o pau), perdem a melhor coisa da vida: os relacionamentos!

    Não há nada melhor do que conversar com um amigo. Ou com um estranho (quem nunca se viu envolvido em uma conversa com um desconhecido não sabe o que está perdendo).

    Acho que nessa nova realidade em que vivemos, é preciso aprender a aparecer menos e viver mais, seja online ou offline. Aproveitar não só os diálogos, mas tudo de bom que o mundo tem a nos oferecer ;)

    Adorei o texto!

    Beijos,
    Nanie

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    1. Olá, Nanie. Agradeço o contato. =)

      Bem, você tocou em um ponto crucial. As pessoas andam mesmo na contramão do diálogo. Andam cheias de si. E o diálogo é justamente o contrário. É colocar-se para fora de si. Desde que o mundo é mundo, tal como o conhecemos, a maldade existe. A humanidade carrega histórica e espiritualmente a semente da violência. Para mudar, falta mais e muita consciência boa. Ainda mais agora que, com as novas tecnologias o discurso raivoso tem tido maior repercussão. Mas, o amor é igualmente contagiante. Daí que precisamos nos abrir para o outro e escutar o que ele tem dizer apesar das diferenças. Mas, tal habilidade comunicativa é acima de tudo capacidade de amar. Falta isso. E isso é tudo.

      Adorei a sua frase final: "Acho que nessa nova realidade em que vivemos, é preciso aprender a aparecer menos e viver mais, seja online ou offline. Aproveitar não só os diálogos, mas tudo de bom que o mundo tem a nos oferecer."

      Endosso totalmente. Não raro, vemos as pessoas cada vez mais distantes das relações com o mundo e com as coisas que nele há. Não lemos, não vemos, não fazemos sem nos munirmos das aparelhagens da exposição tecnológica. Infelizmente.

      Beijocas

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  4. Eu dificilmente posto algo pessoal no facebook, não gosto de me expor assim.
    Acho q a rede social apresenta as pessoas, mas ao mesmo tempo afasta as q já são próximas. Eu não consigo ter uma amizade verdadeira pela internet, preciso do contato cara a cara...

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    1. Olá, Thaynara. Também considero que as redes sociais não implicam comprometimento emocional. Mas,a depender da intenção do usuário, ela serve para várias funções, inclusive, a de fazer valer a proximidade perceptual apesar da separação física. Mas, isso varia de pessoa para pessoa. Vínculo é isso, o jeitinho particular de se relacionar com as pessoas e também depende de cada caso e ocasião. No mais, seja online ou offline, precisamos sim lançar mão do cara a cara, né? Concordo com você. Beijocas

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  5. Que texto maravilhoso. Fico tão feliz quando encontro textos que feitos para que possamos pensar, debater.
    Acho que as pessoas são obcecadas na tecnologia, mas realmente de uma maneira tão egocêntrica que acabam perdendo uma das funções mais interessantes dessa mesma tecnologia: a possibilidade de troca, de diálogo - que como a tecnologia diminui as distância, facilitaria essa troca.
    Infelizmente todos parecem tão preocupados em apenas mostrar, exibir e brigar (porque aja confusão, viu!) que perdem a possibilidade de crescer como pessoas, fazer amizades verdadeiras e que enriquecem.

    Beijos,
    Carissa

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    1. Olá, carissa! Estamos desperdiçando os ricos potenciais da net em favor de sua subutilização. Uma pena estarmos aquém de nossas reais possibilidades. Infelizmente, todos pagam por essa irresponsabilidade ética. Obrigada pelo contato, querida! Beijocas

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  6. Olá Vivi. Que texto belíssimo para se ler, embora eu compartilhe da sua opinião muitos dos seus questionamentos me fizeram pensar algo antes inexistente. De fato, principalmente em meios 'individuais' como os blogs, encontramos pessoas que estão ali para serem vistas, se preocupam excessivamente pelo número de seguidores, curtidas ou compartilhamentos em sua página do facebook ao passo que nem se importam quem está do outro lado da tela do computador fazendo aquilo, ou seja, não se importam com o seu interlocutor. Com um meio de comunicação tão rico como a internet, é uma pena que as pessoas (aqui eu também me incluo) muitas vezes não saibam como aproveitar da melhor maneira. Conhecer novas pessoas, interagir, conversar com elas e sobretudo ter uma opinião própria é fundamental nos dias de hoje. Mais uma vez aqui deixo minha parabenização pelo texto e também pela ideia em criá-lo.

    Um abraço, Clóvis Marcelo.

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    1. Olá, Clóvis! Agradeço o contato. Concordo totalmente. Há um espaço psicológico e emocional que precisa ser transposto, no que tange ao universo dos blogs. Hoje em dia, valoriza-se mais os seguidores e menos os comentadores de maneira que falta superar o dilema quantidade x qualidade. Soa como discussão antiga, mas a realidade que aí está demonstra que tal dicotomia não foi superada. Também me incluo na crítica que faço. Como acredito no poder da reflexão para mobilizar a ação, penso que podemos lançar luz ao problema por meio de discussões bacanas como essa. Afinal, se a net relativiza a distância física, cabe a nós, seres humanos dotados de penso e coração, estreitar os vínculos. Abraços!

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  7. Olá, CMachado! Obrigada pelo contato. O seu depoimento expressa justamente o que vai em meu íntimo. Existe uma frase interessante sobre o Facebook que diz: "Menos face, mais book". É por aí. Vale sermos mais conteúdo e menos egocentrismo, pois esse último se nutre das aparências. À medida que nos esvaziamos de nós mesmos, vamos enchendo a alma do que é importante. Isso é bem o que o diálogo prioriza: a capacidade de sintonizar com o outro. Beijocas!

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  8. Agradeço a todos os comentadores pela excelente contribuição. Um grande abraço!

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  9. Essa pergunta é bem interessante, CMachado e acrescenta muito à discussão. De fato, para o bem e para o mal, as novas tecnologias têm colocado novas demandas às nossas vidas. Sabedoria é saber separar as demandas essenciais das desnecessárias. De outra parte, hoje temos que estar disponíveis ao toque de caixa, de um clique ou,como você disse, da pretensa "urgência" do outro. Parece até que acessamos o outro ao invés de dialogar com ele. Mas, é fato: não dá pra exigir dos outros resposta imediata, muito menos que estejam "online" ao nosso dispor. Comunicação hoje é tudo, sendo portanto, necessário o aprimoramento da competência do diálogo. Caso contrário, vive-se a máxima disseminada por Chacrinha "Quem não se comunica, se trumbica".

    Abraços!

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